O ABC da Música
Se digitarmos no motor de busca do Google "ser músico em Portugal", deparamo-nos essencialmente com links referentes, na sua maioria, a:
- pessoas em particular - biografias de músicos, experiências pessoais;
- artigos sobre o ensino da música e como estudar música no nosso país;
- história da música em Portugal no séc. XX;
- sites de agenciamento de artistas portugueses;
- fóruns - com pouca expressão- de discussão sobre gostos musicais e o estado da música em Portugal.
Apercebi-me que no espaço cibernético é muito difícil encontrar na nossa língua escritos, estudos, artigos, entrevistas, sobre a condição de músico profissional no nosso país...
Aliás, a quase total inexistência de documentação importante e interessante - EM PORTUGUÊS de Portugal - sobre as áreas artísticas parece ser apanágio deste nosso condado...
Da Wikipedia- a enciclopédia livre, que os nossos irmãos do outro lado do Atlântico tomam, possivelmente, como referência, retirei a seguinte definição:
" Adota-se o termo músico quando nos referimos a qualquer pessoa ligada diretamente à música, em caráter profissional, exercendo alguma função no campo de música, como:
- tocar um instrumento musical, cantar;
- compôr músicas/canções;
- escrever arranjos,
- reger, dirigir um qualquer grupo de músicos - orquestras, bandas, big bands, ensembles vocais ou instrumentais;
- leccionar,ou trabalhar no campo de educação ou terapia musical.
Um músico brasileiro pode ter, ou não, uma carteira profissional de alguma instituição que o reconheça, como a Ordem dos Músicos do Brasil.
Um músico também pode ou não ter a formação académico-técnica reconhecida (através de escolas de música, conservatórios, faculdades ou universidades).
Quando ele adquiriu competências e capacidades musicais por sua auto-recriação, diz-se que é um músico autodidata.
Quando ele não tem formação alguma, costuma-se dizer que é um músico popular, amador ou ainda que produz música de ouvido."
Desta descrição destaco a separação (quanto a mim até bastante elucidativa) das diversas actividades de um músico, que de certa forma representam a realidade e as verdadeiras possibilidades de acção nesta área.
Amigos, mães preocupadas, jovens indecisos, confessem:
Vocês não faziam a mínima ideia das diferentes possibilidades - as tais saídas profissionais- na área da música, certo ?! ...
Alguém - até mesmo algum músico - já investiu o seu tempo (em Português diz-se já perdeu tempo=já se deu ao trabalho... ...) a tentar explicar-vos, pelo menos de uma forma razoável, o que é ser músico?
" - Uauuu! Tanta coisa que um músico faz/pode fazer!...Não tinha ideia! Más é difícil ser-se músico, não é? Ou tens um projecto, uma banda que consiga vingar ou és músico de orquestra, ou então vais para professor de música... É difícil..."
Imagino que seja esta a tendência habitual nas já típicas conversas sobre "- então e tu, o que é que fazes?"...
No entanto, o real problema , como nos iremos aperceber, ou, pelo menos que eu tentarei pôr em cima da mesa (gosto desta expressão...) não é a simples escolha pela actividade musical, mas um conjunto de circunstâncias inerentes ao facto de vivermos num país onde a grande maioria dos índivíduos ( felizmente, aos poucos vou encontrando a malta porreira que faz parte da percentagem mais pequena!...)- ainda detém uma visão muito geral, muito básica e muito primária - nalguns pontos por vezes atrasada - sobre o que é ser músico, fazer música, objectivos musicais, formas de estar na música, etc...
Ou seja, a palavra défice volta a entrar no vocabulário...
Que sina esta, de termos de conviver com esta palavra ...
E parece que está presente em muitas áreas...
Mas no caso da Música, o défice de entendimento estende-se mesmo a todos os quadrantes que constituem a estrutura de tudo o que diz respeito à actividade musical, e que vão desde o público, passando por agentes, produtores musicais, produtores de eventos, meios de comunicação e - o mais gritante e por isso o mais importante - os próprios músicos ...
Se me fosse pedido para criar um conceito para esta questão , eu diria que o problema em Portugal está no ABC da Música !
Passo a explicar :
A- público - o lusitano, que é aquele com que eu e a maioria dos leitores (músicos ou não ) lidamos quase sempre, e que, por isso, conhecemos melhor - julgo que é por demais perceptível o ...défice de entendimento da música.
Não da forma empírica e técnica (essa deve pertencer obviamente aos músicos, embora esteja livremente acessível a quem quiser) mas de uma forma cultural e social.
É o que está patente no no "ouvir, escolher, reagir e procurar "... um quarteto de respeito que devia merecer maior atenção: o que é que eu oiço, o que é que escolho ouvir, como é que eu reajo, e será que procuro ?...
Basta ligar todos os dias a televisão e percorrer os principais canais generalistas ( em luso-inglês diz-se fazer zapping...) para nos apercebermos do que se vai instalando nas cabeças e nos olhos do público tuga...
B - a maralha que eu coloco no meio da tal estrutura - produtores de eventos, agentes, meios de comunicação - cujo o entendimento da música , por sua vez, é muitas vezes virado até para outros valores (...) que saem um pouco fora da esfera de intuito cultural e social que deve alimentar a existência da música.
Qual a importãncia de referir défices também nesta área?
É que aparentemente estes sectores - agenciamento, produção de eventos e meios de comunicação - apenas seguem uma permissa muito simples, tipo físico-química "acção-reacção": "oferecemos, mostramos e divulgamos aquilo que se faz e que supostamente se quer ouvir. "
Assim á partida estão apenas a cumprir a sua função elementar e para a qual foram destinados.
Pois...
C- Por outro lado, no que se refere aos próprios músicos, aproveitando a definição da wikipédia, mantenho a convicção forte de que existe então também um défice assinalável no entendimento das diferentes actividades musicais: tocar*, compôr, escrever, reger e leccionar...
Há quem esteja convicto de que esta minha convicção é uma heresia, uma blasfémia ...
Pois não me importo mesmo nada de ser condenado à fogueira.
Galileus e Copérnicos não são novidade...
*Tocar - neste particular abro uma excepção quanto à questão do défice, porque temos um país de excelentes músicos-executantes. E são cada vez mais!
Que se diga convictamente . Porque se diz com toda a justiça !
Contudo, julgo não estar a criar um novo termo ou conceito na música quando escrevo "músicos-executantes"...
E se estiver, então mais á frente no tempo poderei explanar esta ideia ...
Estarei a querer implementar uma distinção?...
Uma pista : os ingleses e os americanos têm os termos "player" e "musician", e usam-nos em circunstâncias, situações e momentos distintos...
Pois é... lá é assim...
A ordem aqui expressa é completamente aleatória, e não seguiu qualquer critério ou atribuição de importância aos 3 parâmetros.
Porque será mais ou menos entendível que esta questão constitui uma verdadeira pescadinha de rabo na boca.
É sobre este ABC da Música que me debruçarei nos próximos posts.
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